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segunda-feira, setembro 04, 2006

144. Palavrões e blasfêmias

Jornal de Cocal: 24 de maio de 2006

Na minha infância convivi muito com famílias de origem italiana no oeste catarinense. Guardo na lembrança o linguajar, o jeito de conversar, expressões corriqueiras e até palavrões e blasfêmias comuns.

O pai de uma de minhas amigas costumava dizer “sacramenha” quando ficava bravo. Era constrangedor estar por perto nos momentos em que ele estava nervoso com os filhos.

Vi muitos agricultores exaltados quando o gado fugia do potreiro invadindo e destruindo parte do milharal dos vizinhos, na lida com juntas de bois arando a terra, quando um cano de água estourava ou mesmo nas épocas de seca. Nem Deus escapava de suas ofensas; o xingamento preferido era “Porco Dio”. Que Deus me perdoe!

Porco Dio era o pior xingamento e por isso o mais usado. Servia para expressar a raiva quando: o tiro de espingarda não atingia o jacu, a roda da carroça escapava, os porcos brigavam no chiqueiro, o leite da vaca secava, os parentes não pagavam uma dívida no dia combinado, etc. Os conselhos do padre nos dias de missa eram dados em vão!

Num sábado à tarde, meu pai queria um martelo e não o encontrou no devido lugar. Subi para procurá-lo no sobrado da casa. Tremendo de medo eu não enxergava a ferramenta entre o caibro e as telhas. O desespero tomou conta de mim por causa dos “Porca Madona” que ecoavam pelos ares. Minha nona já havia dito que um dia, ele seria castigado por maldizer freqüentemente Nossa Senhora, com tanto ódio no coração.

Certo dia, um dos meus tios cortou o pé com o machado enquanto rachava lenha. A dor provocou os demônios interiores. Ele olhava para os céus e gritava: “Lazarento, dum lazarento, dum lazarento. Por que você faz isso comigo? Trabalho o dia inteiro, to cansado, com fome e mais essa!” Eu sabia quem era o destinatário da mensagem. Só não compreendia porquê chamar alguém de lazarento era um meio de ofender. Hoje, suponho que seja por causa do preconceito sofrido pelos leprosos, como Lázaro – irmão de Marta e Maria Madalena. Esse homem foi ressuscitado por Jesus Cristo após o terceiro dia de sua morte. Quem diria que um dia seu nome viria a ser sinônimo de ofensa!

Muitas crianças foram repreendidas pelos professores e pelos próprios parentes por dizerem palavrões. Naquela época, seria ousado demais dizer aos pais que o exemplo educava mais que os conselhos. O autoritarismo imperava na educação familiar. Estranhamente, os pais sentiam-se envergonhados ao serem informados de que seus filhos sendo “mau-educados” na escola ou em outros ambientes sociais: “Por favor, converse com seu filho porque ele vive dizendo palavrões por ai.”

Parece que o tempo encarregou-se de apagar “aquelas coisas feias” ouvidas diariamente. Afinal de contas, hoje em dia, ninguém mais se dirige aos outros, alfinetando com um “filho de la putana”.

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