Jornal de Cocal: 22 de junho de 2005
Pouca gente percebe a existência de um prédio antigo, em péssimo estado, localizado na área central de uma grande cidade e que tem na fachada a seguinte informação: “Pensão familiar”. Lá, moram alguns homens que ao verem se desfazer seus lares, encontraram abrigo. É preciso dizer que não é gratuito, portanto, está longe de ser uma instituição de caridade. Este lugar é um exemplo de quanta solidão existe no meio da multidão.
Pouca gente percebe a existência de um prédio antigo, em péssimo estado, localizado na área central de uma grande cidade e que tem na fachada a seguinte informação: “Pensão familiar”. Lá, moram alguns homens que ao verem se desfazer seus lares, encontraram abrigo. É preciso dizer que não é gratuito, portanto, está longe de ser uma instituição de caridade. Este lugar é um exemplo de quanta solidão existe no meio da multidão.
Dentro dos pequenos quartos há apenas uma cama de solteiro, um roupeiro e uma televisão. É como se fosse uma das celas de um presídio de portas abertas, onde alguns criminosos se fecham cumprindo a pena de terem falhado na vida. Os crimes vão desde, não aceitar ficar sentado num banco escolar para garantir um futuro melhor, dar mais valor à bebida do que à esposa, se afastar dos pais sem dar notícias, perder o emprego por não ter se profissionalizado, até, não poder oferecer uma vida confortável à família planejada num momento de plena felicidade ou de sensação de que se devia arcar com as conseqüências de um ato inconseqüente.
Todos pagam a pensão, a comida e os vícios com muito trabalho. Uns, são pedreiros, outros, ajudantes de pedreiro. Uns, são guardas noturnos de rua que desejam ser promovidos a vigilantes de alguma mansão. Uns, fazem biscates, outros, são aposentados. Uns, acreditam que tudo vai melhorar, outros, já se conformaram. Uns, lamentam seu presente, outros, agradecem por não precisar morar debaixo de uma ponte.
Lutando contra as dificuldades, eles esperam pelas primeiras horas da noite, quando após tomar um banho quente, podem descer a escada da pensão e sentar numa mesa de bar para tomar um gole de cachaça, comer um pastel de carne e ovos, fumar um cigarro, jogar baralho ou dominó e conversar com um amigo. E, ali ficam, até chegar a hora de descansar o cadáver vivo.
Apesar das piadas, risadas, brincadeiras e de responder que está tudo bem quando encontram um conhecido, o coração clama por algo um pouco difícil de explicar, mas que certamente não estariam sentindo se tivessem uma casa própria, uma esposa esperando com uma sopa de caldo de galinha e uma criança para pegar no colo.
Por ironia do destino de quem passou a vida na gandaia, ao lado da pensão há uma discoteca, conhecidíssima por ser ponto de encontro entre mulheres interessadas em notas vermelhas e homens dispostos a negociar, quando a situação financeira permite. O som das “músicas de zona” incomoda não somente pelo barulho que dispersa o sono, mas, principalmente pela dúvida que provoca: “Devo ficar deitado, sozinho, tentar descansar pra não faltar no trampo, amanhã cedo? Ah, se fosse só isso não era nada... O dinheiro está acabando. Não adianta querer se não se tem café no bule. O jeito é sossegar e ficar no meu canto.”
Apesar das múltiplas carências que perseguem essas pessoas, elas são felizes com o pouco que têm. Pode crer!
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