Jornal de Cocal: 3 de agosto de 2005
Neiva adorava usar batons coloridos no inverno, fumar durante os intervalos das aulas e rir das situações em que a vida a colocava. Ela era chamada de “A General”, no colégio onde foi diretora por muitos anos. Poucos sabiam que aquela mulher de físico masculino, comportamento áspero e olhar determinado, era um “doce de pessoa”.
Neiva adorava usar batons coloridos no inverno, fumar durante os intervalos das aulas e rir das situações em que a vida a colocava. Ela era chamada de “A General”, no colégio onde foi diretora por muitos anos. Poucos sabiam que aquela mulher de físico masculino, comportamento áspero e olhar determinado, era um “doce de pessoa”.
Conhecê-la melhor, foi um presente que ganhei, sem imaginar que um dia pudesse aproveitar. Ouvir suas histórias era divertido. Vê-la filosofando era intrigante. Receber seus estímulos era energizante. Buscar seus conselhos era aconchegante. Certamente, ela não faz idéia de que hoje está sendo lembrada por alguém! E, muito menos, que o motivo dessas recordações são coisas simples, mas profundas que um dia, brincando de pensar, expressou livremente.
Neiva dizia não se conformar em ter que almoçar, colocar a louça sobre a pia, escovar os dentes e voltar depressa para o trabalho. Ela achava que as leis da natureza tinham de ser respeitadas, afinal, todas as pessoas sentem sono quando estão com o estômago cheio. Tirar uma sesta era um direito! No entanto, nem ela podia gozar deste prazer. As exigências da sociedade são mais poderosas que qualquer necessidade fisiológica.
Neiva ria saudosamente quando falava sobre a filha que estudava e trabalhava de babá para um casal de médicos, na Alemanha. Era engraçado observar as contradições que fazia: ao mesmo tempo em que criticava a falta de amor, atenção e carinho dos pais alemães para com o bebê – que soubera pelos relatos de Luana, sua filha – afirmava que estavam certos. É claro que lendo nas entrelinhas, percebemos que há ironias que favorecem o bom senso.
Ela contava que quando tinha os três filhos ainda pequenos, ficou viúva e teve que dar um jeito de criá-los praticamente sozinha. Num domingo, quando estava no sítio de sua mãe, surpreendeu-se observando uma galinha com uma ninhada de pintinhos. Comparou as diferenças entre suas crianças e aqueles animaizinhos: os seus choravam em seus braços quando sentiam dor e os da galinha só piavam sem que esta se preocupasse; os seus exigiam a mamadeira pronta e os da galinha procuravam minhocas ciscando pelo terreiro; os seus sujavam fraldas e os da galinha estavam sempre limpos; os seus não a deixavam descansar tranqüilamente e os da galinha não a incomodavam, apenas se aquietavam em suas penas. Apesar de não serem apropriadas essas análises, ela, tinha puramente a intenção de contestar as coisas que não lhe agradavam.
Há dias que acordamos de uma noite mal dormida brigando com todas as células do nosso corpo, lembramos da Neiva e nos perguntamos: “Por que não podemos ficar nessa cama durante o tempo que quisermos?” E a resposta, vem: “Porque vocês jamais mandarão no tempo.” Então, nos damos conta de que a opção pelo sucesso requer respeito por todos os tipos de tempo. Infelizmente, essa é uma das verdades mais complicadas que se plantou sobre a terra.
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