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domingo, setembro 03, 2006

136. Continuando nossa conversa

Jornal de Cocal: 29 de março de 2006

Durante a missa, excepcionalmente hoje, não prestei muita atenção ao sermão do padre que se referia ao mandamento extra de Jesus Cristo: "Ame a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a ti mesmo". Passei a maior parte do tempo fazendo agradecimentos.

Sei que você, na sua juventude sonhadora e de certa maneira arrogante, irá rir interiormente ao saber das coisas que agradeci por ter conquistado durante minha caminhada de setenta anos. Sou imensamente grato pelo teto que me abriga, pelo plano de saúde que consigo pagar, pelas roupas que visto, pela comida que posso buscar no mercado quando quero, pelo título do clube que mantenho porque gosto de nadar e de jogar bocha, pela conta baixa na farmácia, pela luta recompensada ao ver meus filhos diplomados na faculdade e por nunca ter ficado desempregado.

Talvez eu não esteja lhe dando tempo para me questionar, mas já a conheço o suficiente e, portanto, posso revelar as perguntas que circulam em sua cabeça: "O senhor agradece por esta casa de quatro cômodos com uma modesta garagem onde guarda um fusca? Uma vida toda batalhando e se conforma em poder pagar coisas básicas? Anos e anos economizando em função de pagar mensalidades para os filhos estudarem? E acha que ser mineiro, motorista de ônibus e vigia de prédios residenciais até se aposentar é algo bom?" Dói, meu coração chora, porque vejo que minha aparência física, os erros de português que aprendi a manter durante décadas, a simplicidade que me cerca e as dificuldades que driblo, são motivos de vergonha para a única neta que gerei.
Você briga com sua mãe dizendo que não pediu para nascer e que precisa de liberdade. Vejo uma adolescente atrevida e chantagista berrando e batendo portas, dia sim, dia não. Como tens coragem? Ontem, vi uma cena chocante: uma mulher grávida, sentada nas escadas do terminal rodoviário, bêbada e discutindo com um homem que, suponho, ser o pai das duas crianças que estavam em seu colo e também do bebê que ela carregava no ventre. Se você acha que pode protestar dessa maneira, o que se dirá daquelas... Suas atitudes me fazem lembrar de quanto amor recebestes deste que vimos o resultado positivo do exame de sangue que sua mãe fez ao suspeitar da gravidez, depois de enfrentar processos dolorosos devido a problemas de infertilidade. Ela pediu, implorou, rezou e buscou tratamento para tê-la em seus braços.

Queres liberdade? Há meninos, depois da meia-noite, andando pelas ruas e perambulando pelas praças. Eles nem se preocupam em voltar pra casa porque não são esperados com um jantar decente e lençóis limpos. Penso que adorariam ter pessoas que exigissem que estivessem na cama antes das dez horas, com as tarefas escolares prontas e os dentes escovados.

De forma alguma estou lhe pedindo que se conforme, aceitando a vida como ela é ou parece ser. A ambição recheada de sonhos é necessária. Porém, não esqueça dos princípios éticos e dos valores que lhe foram repassados através de sua humilde família. Eles valem mais que um celular, um caderno de capa dura, um computador com acesso ao mundo virtual, uma noite na balada, uma blusinha da moda.

Não quero ser e nem sou exemplo pra ninguém, no entanto, entendo os dez mandamentos e os sigo porque Deus não estava brincando de fazer leis. Na verdade, Moisés escreveu nas tábuas o que está já está escrito em nossa consciência ao nascermos. A felicidade, nosso maior objetivo, se encontra em nosso coração quando somos do bem.

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