Pesquisar este blog

segunda-feira, janeiro 13, 2014

ISCA DE ISCA



Quase todos nós já tivemos a oportunidade de acompanhar a retirada de minhocas da terra. Sabemos que basta procurar um terreno úmido e adubado - preferencialmente próximo a um chiqueiro ou num canto da horta onde se acumulam restos de comida - remover o solo com uma enxada e rapidamente veremos esses animais anelídeos se retorcendo desesperadamente. Sem demora, estarão dentro de um pote de margarina ou num vidro de café solúvel – vazios, é claro! - aguardando o momento em que serão úteis - para o Homem, é óbvio! - chamando a atenção de uma carpa. “Esses moluscos – como disse equivocadamente, certa repórter de televisão, pois minhocas apesar de terem o corpo mole não apresentam as mesmas características dos polvos – podem ser reproduzidos em cativeiro e auxiliam na decomposição orgânica, acelerando o processo de formação de húmus”.
Como todo ser vivo que existe na terra parece ter um semelhante no mar, como o leão e o leão-marinho, o cavalo e o cavalo-marinho, o boi e o peixe-boi, o cachorro e o peixe-cachorro, o rato e o cação-rato, o pepino e o pepino-do-mar, não é diferente com as minhocas. Vi algumas pessoas caçando minhocas do mar na praia do Cardoso, que aliás, seriam usadas como iscas. E para pegá-las era necessária outra isca: fígado de cação. Essa espécie de minhoca pode medir até dois metros de comprimento, porém, não se aproveita muito mais que vinte centímetros do seu corpo, pois a parte da cauda é extremamente sensível.
Como toda professora, também tenho dificuldades de me desvencilhar da realidade presente em sala de aula. Até as minhocas desenterradas da areia mexeram com as “minhocas da minha cabeça”. Fiquei pensando nas falas de Celso Antunes e Rubem Alves sobre a importância de saber cativar e educar. Imaginei a quantidade de iscas que procuramos todos os dias antes de irmos para as pescarias que raramente são abundantes, frequentemente dão o suficiente pra sobreviver ou resultam em grandes fracassos. É a nossa luta diária pela qual passamos enfrentando tempestades, sentindo medo de não estar usando os equipamentos corretos e de vez em quando, curtindo o nascer e o pôr do sol.
Os pescadores são diferentes de nós professores. Eles sabem qual é o tipo de peixe que tem na área e escolhem a melhor isca; nós, temos que capturar diversas espécies simultaneamente, desde aquelas que podem ser pegas com iscas simples, como as feitas de farinha de milho, àquelas que são exigentes e só são atraídas por camarão.
O dono de um dos restaurantes do Farol de Santa Marta contou que a Capitânia dos Portos fez um teste com cento e oitenta pescadores da região e descobriu que apenas dois sabem nadar. E, acrescentou: “Meu sogro morreu com quase noventa anos, desde criança se criou no mar, viveu pescando e se caísse na água, iria pro fundo na certa”. Os números são impressionantes. Pensei: “Como pode uma coisa dessas! Não parece concebível que pescadores não saibam nadar.  Se fosse três, quatro, cinco... mas, quase cem por cento deles! Apesar de viverem trabalhando sobre as ondas, eles as conhecem tão bem que não correm risco de morrer.”
Talvez, essa seja uma prova de que é possível sobreviver sem os conteúdos que a escola considera elementar para enfrentar os desafios do mundo. Ou, quem sabe, é um exemplo do quanto os pescadores da educação são capazes de fazer mesmo sem saber nadar direito e tendo algumas minhocas à mão.

Um comentário:

Manoel disse...

Uahu Ana, excelente texto.parabens. uma história com início, meio fim e uma reflexão. Gostei